Neste ano e no próximo, a meta do governo é um resultado zero. Ou seja, receitas iguais às despesas. O arcabouço fiscal, porém, permite que se chegue a um resultado negativo de até 0,25% do Produto Interno Bruto, o equivalente hoje a R$ 28,7 bilhões. Mas nos dois anos a conta no vermelho vai ser maior que essa.
Em 2024, isso vai acontecer principalmente devido aos chamados créditos extraordinários, editados para fazer frente a situações imprevisíveis e urgentes. As regras fiscais permitem que esse tipo de despesa seja computado fora da meta. Por isso, gastos para combater incêndios — decorrentes da seca — e para lidar com as chuvas no Rio Grande do Sul não serão contabilizados, embora engordem o déficit “real” das contas públicas.
Para o ano que vem, o resultado previsto pelo próprio governo é de um rombo de R$ 40,2 bilhões. Dessa vez, o déficit será maior porque o governo vai pagar R$ 44,1 bilhões em precatórios fora da meta com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF). Precatórios são gastos decorrentes de decisões judiciais.
— Os abatimentos previstos na legislação têm ajudado o governo na tarefa de cumprir as metas fiscais, mas podem mascarar a situação das contas públicas. Independentemente desses abatimentos, a dívida pública pode subir mais — disse Alexandre de Andrade, economista da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado Federal.
Estimativas da IFI apontam a que a dívida pública deve atingir 84,1% do Produto Interno Bruto (PIB) no fim de 2026. Em dezembro de 2022, o percentual do endividamento estava em 71,7%. Pulou para 78,6% do PIB em outubro deste ano. Com a piora do resultado das contas e o aumento da taxa de juros, o próprio governo já vê a dívida bruta em 81,6% a partir de 2026.
Segundo Andrade, é pouco provável que o governo consiga estabilizar a dívida em relação ao PIB em razão da dificuldade de realização de superávits primários nos próximos anos. Em 2024, destacou, houve o ingresso de quantias expressivas de arrecadação de Imposto de Renda sobre o estoque dos fundos exclusivos e das offshores (R$ 22,8 bilhões), receita que não se repetirá nos próximos exercícios.
O patamar de 80% do PIB de endividamento bruto é considerado um marco por especialistas porque é visto como alto para um país com as características do Brasil. Nas estatísticas do Banco Central, a única vez em que a dívida bruta ficou acima de 80% do PIB foi durante a pandemia de Covid-19.
Procurado o Ministério da Fazenda não quis comentar. O Ministério do Planejamento argumentou que do valor descontado da meta neste ano quase a sua totalidade refere-se a calamidades públicas (Rio Grande do Sul e seca) e 4% à decisão do Tribunal de Contas da União acerca do Judiciário. A pasta alega que a dispensa do alcance da meta fiscal era prevista.
O Globo
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